Os interessados nas ferrovias brasileiras

Muitas discussões sobre as ferrovias são limitadas a determinados interesses e pontos de vista. Procura-se destacar pontos positivos e desconsiderar que um sistema de transporte é um dado social que se relaciona com tudo e com todos. Para uma melhor compreensão das realidades e fenômenos envolvidos, é importante que as análises sejam mais abrangentes, considerando a organização, o uso e a regulação do sistema ferroviário.

A organização considera os locais em que as linhas ferroviárias estão presentes e os pontos de conexão das malhas. O uso pode ser analisado pelos produtos e volumes transportados e pela qualidade dos serviços prestados sob a ótica dos usuários.

A regulação está relacionada à política dos agentes participantes do setor, à maneira como eles se relacionam, às leis, normas e regras comerciais utilizadas, além das políticas públicas de transportes e dos investimentos planejados e realizados.

A nova regulação do setor ferroviário verificada atualmente teve início em 1996 com o processo de privatização, cujos serviços de transportes foram definidos nos contratos de concessão. A proposta do processo de privatização era estimular a participação de várias empresas e investidores. Para possibilitar isto, nenhum investidor poderia ter mais de 20% de participação nas concessões ferroviárias. Mas a situação atual é muito diferente do estabelecido originalmente, já que o sistema ferroviário opera na forma de monopólio controlado por três empresas.

A participação de instituições estatais no setor ferroviário é uma das características do atual momento, apesar da privatização indicar à época a necessidade da saída do Estado do setor. O BNDES participa ativamente do controle acionário de empresas como Vale e CSN, operadoras de grande parte da malha ferroviária nacional. O BNDES também é o grande financiador, junto com outros bancos e fundos estatais, das principais obras ferroviárias.

A regulação do setor carece de índices que tratem da qualidade dos serviços de transportes. Há muitas reclamações de usuários, considerados dependentes de ferrovias, pois as concessionárias priorizam o transporte de suas próprias cargas. A quebra de contrato de transporte e o pagamento de multas são práticas muito comuns nas relações entre concessionárias e proprietários das cargas.

As regras comerciais das concessionárias também precisam ser discutidas e avaliadas, já que o frete utilizado nas ferrovias é baseado no frete rodoviário e não a partir de parâmetros inerentes à operação ferroviária.

Com relação ao planejamento do sistema ferroviário nacional, verifica-se que o uso mais amplo das ferrovias, que previa o transporte de cargas e passageiros, está sendo substituído por sistemas de transportes particulares e restritos a determinados usos e interesses.

A maneira como a regulação do setor é praticada atualmente é um dos grandes problemas para a expansão das ferrovias no país.