Cidades e ferrovias

No Brasil, as ferrovias tiveram um papel importante na organização da região oeste do estado de São Paulo. Elas foram construídas no século XIX para atender o escoamento da produção de café destinada às exportações, mas contribuíram, também, para a criação de muitas cidades do interior paulista.

A relação histórica entre ferrovias e cidades, no entanto, passou por momentos distintos no país. Até a primeira metade do século XX, aproximadamente, as ferrovias tinham uma relação muito positiva com as cidades, principalmente por exercerem o monopólio dos transportes terrestres. As cidades dependiam das ferrovias e funcionavam muito em função dos horários de chegada e partida dos trens. Grande parte das novidades chegava pelas estações ferroviárias.

Na segunda metade do século XX, com a redução do tráfego de trens e o abandono de muitos ramais, trechos e infraestruturas, as ferrovias se revelaram um problema para grande parte das cidades cortadas pelos trilhos. Foi um momento em que grandes investimentos foram realizados nas regiões urbanas para a construção de viadutos destinados à transposição de trilhos e pátios ferroviários pouco utilizados.

No período atual, a reativação dos trens e o aumento dos fluxos de composições promoveu uma nova alteração na relação entre cidades e ferrovias. As cidades passaram a ser consideradas pelas concessionárias um obstáculo para a operação das ferrovias, já que as áreas urbanas e as passagens em nível (Figura 7) interferem nos fluxos das composições, reduzindo a velocidade média dos trens.

Passagem em nível em Sumaré (SP) – 2008

As áreas urbanas cortadas por linhas ferroviárias estão enfrentando, também, um novo desafio, pois as composições, alcançando quilômetros de extensão, atrapalham o funcionamento das cidades principalmente por conta das passagens em nível. A cidade para quando composições com até 1,5 quilômetro de comprimento se transformam em muros, impedindo a passagem de pedestre e veículos de um lado da cidade para o outro. Como no passado, a cidade volta a funcionar novamente de acordo com os horários das empresas ferroviárias, porém, neste caso, de forma conflituosa e negativa.

Os traçados das novas ferrovias em construção indicam que não é prioridade dos trens atender as regiões de maior atividade econômica no país e as principais cidades dos estados do Sul e Sudeste. O sistema ferroviário atual está sendo utilizado para transportar commodities aos portos, exigindo o isolamento das linhas através da construção de corredores de exportação.

As ferrovias do momento atual não promovem as mesmas transformações no território de momentos anteriores. A relação atual entre estações ferroviárias e cidades mudou de conteúdo e sentido, dificultando fazer qualquer relação direta entre investimento em ferrovias e desenvolvimento econômica e social. Esta nova realidade faz com que as cidades fiquem cada vez mais distantes fisicamente e politicamente das ferrovias.